Eu fiz... E deu certo
Conheça cinco histórias de gestores que, sem medo das dificuldades, arregaçaram as mangas e conseguiram transformar a realidade de suas escolas, para a alegria da comunidade, das famílias e dos estudantes
Paula Pacheco e Rodrigo Ratier
Nova proposta de ensino
Plácido José Souza Cavalcante é diretor do EE Liceu, de Maracanaú, a 20 quilômetros de Fortaleza, há três anos e meio. Frustrado com o desempenho dos alunos, reuniu a comunidade e implementou uma série de mudanças. Uma delas foi a substituição do ensino anual pelo semestral, com um período para as disciplinas de Ciências Humanas e outro para Ciências da Natureza. A aposta foi na concentração como forma de facilitar o aprendizado, com uma revisão no semestre seguinte para que o aluno atualize os conhecimentos. Outra inovação foi a prova que os estudantes podem levar para casa e responder no dia seguinte, na escola. "Isso provocou uma mobilização geral. Começamos a ver turminhas de alunos espalhadas pela escola antes das avaliações", explica. O teste acontece duas vezes ao ano, dura três dias e tem peso de prova bimestral.
O Liceu, que ficou em sétimo lugar no Enem no Ceará, com média de 5,3, recebeu vários prêmios e participou de eventos nacionais e internacionais. Para Plácido, o sucesso deve-se à união de docentes, funcionários e comunidade. "As pessoas gostam de ser estimuladas, de ser solicitadas. O papel do diretor é valorizar o ser humano e as suas crenças", conclui.
Desafio amazônico
Na EE Pedro dos Santos, as paredes falam. E muito: o que primeiro salta aos olhos é a manutenção impecável da construção, com salas bem conservadas e banheiros cheirando a limpeza. Na área comum, a produção da criançada ganha voz em painéis, dividindo espaço com quadros sobre a missão da escola e seus objetivos estratégicos. Até o teto tem história: dele pendem poesias dos alunos, decorando as mesas do refeitório ao lado do jardim florido.
Tudo muito diferente da situação encontrada pelo gestor Paulo Amaro Gomes de Andrade em 2001. À época, não havia saneamento básico nem luz elétrica, e a evasão batia em alarmantes 47%. Hoje, a aprovação é de 96%, e o abandono, apenas 2%. Uma revolução, reconhecida com o Prêmio Nacional de Referência em Gestão Escolar de 2005, que começou a nascer com a aposta nas relações interpessoais. "Ao longo do meu primeiro ano, organizei reuniões mensais com a comunidade para que, juntos, decidíssemos qual escola queríamos. Foi uma forma de dividir a gestão entre todos", lembra.
A partilha de responsabilidades segue valendo. Os produtores locais doam frutas para completar a merenda escolar. As contribuições voluntárias bancam pequenas reformas e o diesel dos barcos, que transportam cerca de 800 estudantes. Se alguém quebra uma cadeira, tem de consertar. Pais de alunos faltosos precisam ir à escola justificar a ausência. Os professores, por sua vez, fazem o planejamento diário e uma lista mensal para as famílias com os conteúdos ensinados.
O registro de todos esses compromissos fica nas mãos do diretor. Para cada tarefa, da entrega do material escolar ao número de faltas, Paulo mantém um caderno. "Isso dá agilidade ao diagnóstico dos problemas. Depois, as melhorias são socializadas nos murais." A próxima batalha é ampliar as instalações para atender melhor os 950 alunos - hoje, há salas sob a cobertura externa da quadra de esportes. Mas o esforço de não deixar ninguém para trás é reconhecido mesmo por quem não estuda em condições ideais. Durante a manhã em que a reportagem de NOVA ESCOLA esteve na Pedro dos Santos, um grupo de meninas do 1º ano do Ensino Médio embelezava, com arranjos de girassóis, cada carteira da sala improvisada. Na escola em que as paredes falam, até uma classe sem paredes dá o que falar.
No ritmo da fanfarra
Em Sertãozinho, a 340 quilômetros de São Paulo, o distrito de Cruz das Posses era discriminado pela população urbana. Apesar de encravado numa região de alto poder aquisitivo, o lugar tem uma população de baixa renda, formada, na maioria, por trabalhadores rurais. A falta de perspectivas era passada de pai para filho, a evasão escolar era grande, as meninas só cogitavam trabalhar como domésticas e os meninos desistiam dos estudos para cortar cana-de-açúcar. Sidney Roberto Fernandes assumiu a direção da EE Dr. Isaías José Ferreira em 2002. Mesmo sem experiência, entusiasmou-se com o desafio. Um instrutor de Música se ofereceu para ajudá-lo num projeto extraclasse, que acabou extremamente bem-sucedido. Os instrumentos foram encontrados num depósito de coisas antigas, e assim nasceu a fanfarra, com cerca de 100 integrantes, hoje premiada e com participação em eventos de vários estados.
Num primeiro momento, a banda mudou o clima na escola. Mas o que realmente importa é que os alunos vêm obtendo desempenho cada vez melhor: a taxa de aprovação nas séries finais do Ensino Fundamental está na casa de 95%. Cada estudante passou a ter uma ficha individual de avaliação e a equipe aproveitou a gestão participativa proposta por Sidney para se envolver mais no dia-a-dia. Professores viraram voluntários no Projeto Lado a Lado, que reúne até seis jovens com dificuldades de aprendizado em grupos de estudo. Eles têm atividades de reforço e são liberados quando o educador percebe que atingiu o objetivo. Uma verdadeira aula de dedicação.
Diretora em sala de aula
Maristélia Alves Santos é diretora do Centro de Atenção Integral à Criança (Caic) de Palmas, capital do Tocantins, há nove anos. Ela tem sob sua responsabilidade 1,6 mil alunos. Para entender melhor as dificuldades de aprendizagem deles, Maristélia tomou uma decisão inusitada: passou a assistir às aulas. Foi depois disso que ela propôs a criação de turmas dentro de cada classe, de modo a permitir que os professores dessem atenção especial para quem tinha dificuldades. Outra idéia foi implantar uma metodologia de ensino por blocos. As aulas passaram de 48 para 120 minutos e, em vez de 12 disciplinas, os estudantes agora têm de seis a oito.
Hoje, a escola tem evasão zero e há espera por vagas - um quadro bem diferente do que a diretora encontrou na chegada. "O Caic era ocupado por gangues, sem a participação da comunidade e com funcionários descompromissados. Quando assumi, pensei em entregá-la. Mas isso se tornou parte do desafio de mudar aquela situação e envolver todos", conta. Ela apostou na descentralização e divide com a Associação Comunidade Escola todas as decisões sobre investimentos e novos projetos.
A dança da aprendizagem
Sandra Luzia Ferreira Reis conseguiu transformar a realidade da EM Bataillard, em Petrópolis, a 67 quilômetros do Rio de Janeiro. No cargo há 15 anos, ela encontrou um quadro desolador quando chegou à instituição. Em meio a uma região pobre e freqüentada por alunos que haviam abandonado outras escolas ou tinham sido "convidados a sair", Sandra apostou na abertura das portas para a comunidade como forma de conseguir apoio nos projetos e conter a evasão. Além de virar um ponto de encontro para a discussão dos problemas dos moradores, a Bataillard passou a oferecer nos fins de semana atividades paralelas, como emissão de documentos, corte de cabelo e pequenas oficinas para os pais. Aos poucos, com essas ações, descobriu-se que aqueles estudantes tinham outras vocações. E foi assim que surgiram um grupo de teatro e um de dança, que já viajaram para várias cidades do país e até para o exterior. O desempenho em sala de aula também mudou. Em 1993, Sandra lidava com um índice de reprovação que chegava a 50% ao ano. Hoje a aprovação é de 90%. No Ideb também houve avanços. A escola saiu de 3,6, em 2005, para 4,2, no ano passado.
"No começo, a vontade era ir embora. Mas hoje a situação é completamente diferente. Aos poucos, outros funcionários foram chegando e se engajando no projeto. Eram pessoas que, assim como eu, não se contentavam com pouco", recorda. Atualmente, a maioria participa de forma voluntária de atividades extraclasse. E no horário de aula cada um procura fazer o seu melhor. A merendeira, por exemplo, além de buscar o apoio de nutricionistas para aprender novas formas de aproveitar os alimentos, ensina a importância da boa alimentação. As reuniões com toda a equipe ocorrem pelo menos uma vez por mês. É uma oportunidade para que os funcionários de diferentes departamentos façam propostas para aperfeiçoar a escola e a relação com os estudantes. "É quando falamos também sobre os resultados, que seguem em alta. Aí todos ficam ainda mais animados e o ciclo se realimenta", ensina Sandra.
Fonte: Revista Nova Escola (11/2008)
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